sábado, 12 de maio de 2012

DOS PRESÍDIOS E DAS PENAS

Na advocacia, durante alguns anos priorizei o processo penal. Nessa condição, muitas vezes estive em presídios para falar com clientes sobre assuntos ligados a processos que clientes sofriam. Confesso que não tenho saudade desse tempo. Ainda guardo na memória o quadro degradante constatado, em que pesem os esforços de administradores e servidores da área. Já na década de 1970, as penitenciárias apresentavam condições humanas degradantes. E o pior é que, de lá para cá, salvo exceções, o quadro só se deteriorou.

Por isso, os presídios sempre foram um “prato cheio” para advogados de pessoas denunciadas por infrações penais. Com suporte nessas carências, vociferavam no Tribunal do Júri com afirmações como: “é nessa masmorra que o Promotor quer trancafiar esse miserável réu”. Alguns, mais catastróficos, chegavam a dizer que, se condenado, seu cliente seria transferido para o Presídio Central. A esse aceno, jurados se emocionavam e até calafrios sentiam. E muitos acusados, na carona dessa cantilena, foram absolvidos.

Nessas décadas, o que mudou, e para pior, foi o desrespeito à dignidade humana. A CPI do Sistema Carcerário, da Câmara Federal, segundo o relator, Domingos Dutra, “grande parte dos presídios visitados não serve nem para bichos”; para o CNJ, as condições degradantes do sistema penitenciário e de internação de adolescentes em conflito com a lei no Brasil podem ser consideradas exemplos de violação dos direitos humanos”; e para Zaffaroni, jurista argentino, a demonstrar que o problema não é só do Brasil, “o cárcere é uma gaiola, uma máquina de fixar os comportamentos desviados das pessoas e agravá-los. Há 200 anos nós sabemos que a cadeia do século passado fazia a mesma coisa que a cadeia de hoje.

Então, eliminemos as cadeias? Não. É que há pessoas que não podem viver em sociedade. Hoje, a psiquiatria esclarece que há muito mais psicopata do que se imagina. São incendiários, sádicos, assassinos, torturadores, perversos, pedófilos, muitas vezes ocultados pelos familiares. Logo, pela voz da razão - e das ruas, também -, o povo quer mais cadeias e mais gente dentro delas. Há, inclusive, revolta contra a permanência de infratores livres nas ruas.

Fazendo um retorno à origem dos presídios e sua destinação, tem-se que as penas tinham caráter retributivo (a cadeia era o lugar em que o mal era pago com o mal); em estágio posterior, passou a ter caráter reeducativo (o infrator lá seria reeducado); por fim, chegou ao caráter preventivo (prevenir para não precisar “fechar”). A legislação brasileira direciona-se à ressocialização e à prevenção. Só que, no estágio a que estão su bmetidos os presidiários, poucos se ressocializam. Pior, os presídios viraram escolas do crime.

Aliás, durante o tempo em que tive contato amiúde com presídios, os poucos apenados que vi recuperados, salvo honrosas exceções, o foram pela obra de religiosos. Foram aqueles ex-detentos que saíram das casas de segregação com Deus no coração e com a bíblia na mão. Importa dizer que, dentre as funções que justificam a prisão, a medida extrema, hoje, cumpre apenas o caráter retributivo, sem agregar reeducação nem prevenção.

A bola da vez no RS é o Presídio Central. Condenado pelo CREA, o governador Tarso sentiu-se ofendido pela pressão da OAB/RS e dos juízes das execuções criminais para fechá-lo. Sem razão. Afora sua infraestrutura desumana, quem lá manda são os detentos. Segundo Sidney Brzuska, Juiz com passagem marcante por aqui, o Presídio Central, por imposição e exploração econômica pelos próprios apenados, tem o m2 de área construída mais caro da capital. Outrossim, essa é apenas a ponta do iceberg: o fracasso do Estado. Logo, a privatização do sistema penitenciário deve, sem ranço, ser discutida.

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