quinta-feira, 10 de julho de 2014

A APOSENTADORIA DO JOAQUIM


Joaquim Barbosa está deixando o Supremo Tribunal Federal ao encaminhar pedido de aposentadoria, precoce, a meu sentir, embora tenha tempo mais do que suficiente para jubilar-se. Da presidência da Corte Suprema (seu mandato de presidente iria até dezembro), já renunciou, assumindo o vice-presidente, o ministro Francisco Lewandowski. Também a relatoria do Mensalão mudou. Assumiu o ministro Luís Roberto Barroso. Com esses dois ministros, mais Dias Tofoli (ex-assessor de José Dirceu), um ministro de poucas luzes jurídicas, a discussão dos temas de alta indagação jurídica deixará de existir, mas a gratidão àqueles que os indicaram para os postos vitalícios do STF, não. Portanto, decisões “de faz de conta”, quando envolvidos réus do colarinho branco, doravante não serão novidade. Para não ficar apenas na retórica, trago o exemplo: Lewandowski, o novo presidente da Corte na vaga deixada por Joaquim, na 1ª sessão por ele presidida furou a fila para colocar em pauta os pedidos de serviço externo de José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil, e de outros seus comparsas. Assim decidiu Sua Excelência sob o argumento de que “preso tem pressa”. Que descoberta! Ora, isso é mais velho do que andar a pé. Mas será que só esses apenados têm pressa? E os outros, alguns que já cumpriram integralmente o tempo de condenação? Ah, entendi. Os outros, em geral são defendidos por advogados que atuam como defensores dativos (sem honorários), isso quando advogados têm. Já aqueles que saquearam o Brasil com a cumplicidade do Lula - mas que o ex-presidente nada sabia, é claro -, têm a defendê-los os advogados mais bem pagos do Brasil. Com que dinheiro? Através de vaquinhas: R$ 2,00 de um, R$ 5,00 de outro. Ora, assim como Jesus fez o milagre da multiplicação dos pães, para alquimistas arrecadar no chapéu R$ 2, 3, 5 milhões, é barbada.

Voltando um pouco no tempo, lembro que o ministro Lewandowski, durante o julgamento do Mensalão, foi um Xerifão na defesa dos acusados, negando provas e evidências, fazendo cansativos apartes, lendo inúteis de recortes de jornais. E, ao proferir votos, estendia-se por horas a fio, tudo com o claro objetivo de retardar a decisão final para, assim, levar os delitos ou, pelos menos, alguns deles, à prescrição. Seu comportamento protelatório de então, no entanto, mudou tão logo ascendeu à presidência da Casa. Agora passou a ter a pressa que antes não tinha. Na 1º sessão do STF que comandou, tratou de levar a julgamento os pedidos de serviço externo dos condenados do Mensalão, que o incorruptível Joaquim havia negado. Furando a fila, chamou a julgamento esses casos, solicitando, inclusive, a advogados de outros julgamentos em pauta que, naquele dia, faziam sustentação oral, a que fossem “breves” em suas considerações porque havia outros julgamentos que não poderiam esperar. Quem tinha pressa, na verdade, eram José Dirceu e outros.

Por sua vez, o novo Relator do Mensalão, Luis Roberto Barroso, o último ministro nomeado pela presidente Dilma para o Pretório Excelso, tergiversando em seu voto sobre os pedidos de serviço externo referidos, condenou o sistema carcerário brasileiro afirmando que “a população carcerária é uma minoria invisível que não tem representação”. A respeito, concordo com a colocação. Os presídios brasileiros, salvo exceções, são desumanos. No entanto, os mensaleiros nunca estiveram em presídios humilhantes. Ademais, nada justifica a concessão de privilégios àqueles que desviaram milhões de reais que tanto falta para a educação, a saúde e a segurança pública. Outro argumento de Barroso foi de que, diante da escassez de vagas nas colônias penais, o trabalho externo passou a ser uma necessidade. Que novidade, ministro! Fernandinho Beira-Mar concorda em número, gênero e grau com o novo Relator.  

Eu suma, quando revisor do Mensalão do PT, Francisco Lewandowski procrastinou o julgamento presidido e relatado por Joaquim Barbosa. Assim que, como vice, assumiu a presidente do STF, mudou de lado. Agora, tudo faz para tornar céleres os pedidos dos réus que antes da condenação protegeu ao máximo. Incoerente, para dizer o menos, é o comportamento do novo presidente do Supremo Tribunal Federal.

A MORDIDA DO LUISITO SUÁREZ


A pena aplicada pela Federação Internacional de Futebol Associado (FIFA) a Luisito Suárez, astro da seleção do Uruguai, pela mordida em Chiellini, zagueiro da Itália, na partida pela Copa do Mundo em realização no Brasil, vencida pelo país vizinho, foi pesadíssima: nove jogos de suspensão pela seleção, quatro meses afastado de competições de futebol, inclusive como expectador, e multa pecuniária. Para a FIFA, o seu Tribunal - apêndice da entidade, constituído, à semelhança do STF atual, por amigos do presidente - aplicou pena exemplar. Mas pode alguém, sem moral, punir exemplarmente? Por isso, nem tanto pela condenação, já que, à exceção do Uruguai, ninguém alegou inocência do acusado, mas pelo tamanho do castigo, o mundo reagiu com indignação.

Luisito mereceu ser condenado. Ademais, não foi a 1ª agressão do gênero em campos de futebol. A questão está no exagero. Dois a três jogos, condicionado o retorno do atleta aos gramados à aprovação em exame de sanidade mental. O exame é exigência de ordem pública, tamanha a fúria na caçada que imprimiu a Chiellini no jogo do Uruguai contra a Itália, até alcançar e ferir o adversário. Mas a pena foi demasiada, friso, e o rigor máximo deve ser evitado. A propósito, já proclamava o Direito Romano: o máximo do direito (lei é fonte de direito) se converte no máximo da injustiça.

O caso Luisito envolve erro do árbitro, salvo pela utilização de imagens de TV. Ressalto o fato porque em outras copas, erros de árbitros ocorreram sob os olhares complacentes da Fifa e com os aplausos de muitos que hoje crucificam o craque uruguaio. Brasil e Argentina, para ficar só com dois países da América do Sul, campões de outros certames, se beneficiaram de erros grosseiros. Vamos aos casos:
- na Copa de 1962, no jogo Brasil x Espanha, Nilton Santos, lateral esquerdo da nossa seleção, cometeu um pênalti. O árbitro assinalou a infração. Mas como estava longe, o nosso lateral foi dando passos à frente até sair da grande área. O mediador, na dúvida, sinalizou fora da área, que deu em nada. Mas se fosse dentro da área, provavelmente seria convertida em gol, eliminando o Brasil da competição que o sagrou campeão pela 2ª vez;
 - na Copa de 1986, em que a Argentina foi campeã pela 2ª vez, Maradona, no jogo contra a Inglaterra, fez, com a mão, o gol que salvou o país. Depois, orgulhoso, confirmou a irregularidade, e o povo argentino passou a dizer que se tratava de La Mano de Dios (a Mão de Deus). Ao invés de ser censurado, Maradona foi transformado em herói;
- na Copa do Mundo de 2002, o nosso atacante Luizão foi derrubado fora da área, mas se arrastou até dentro das quatro linhas, induzindo o árbitro em erro. A infração, convertida em gol, foi decisiva para as pretensões da seleção brasileira;
- na Copa do Mundo em andamento, no jogo da nossa seleção contra a Croácia, Fred simulou um pênalti, que o árbitro da partida apitou. O atacante e o técnico brasileiros juram que foi pênalti. A infração inexistente foi decisiva para que a nossa seleção fosse adiante.

Os quatro casos relatos retratam infrações que, potencialmente, inverteram resultados naturais de competições. Porém, em todos é realçada a esperteza dos seus protagonistas, Nilton, Maradona, Luizão e Fred, pouco interessando que tenham ludibriado os árbitros e, com isso, prejudicado terceiros. Mas o gesto do uruguaio difere dos gestos dos brasileiros e do argentino. Luisito cometeu agressão física; Nilton, Maradona, Luizão e Fred cometeram agressões ao espírito esportivo. São, pois, dois os grupos de irregularidades: o 1º (uruguaio), atentado físico a uma pessoa; o 2º (brasileiros e argentino), atentados ao espírito esportivo mundial. A meu sentir, as agressões coletivas deveriam sofrer maior castigo. Mas não. Enquanto a malandragem é absolvida, às vezes enaltecida, a mordida é duramente castigada.

É o sinal dos tempos. É a inversão de valores. Zé Dirceu, Delúbio, Genoíno, condenados no maior escândalo de corrupção da história brasileira, foram, pele direção do PT, alçados à condição de heróis, enquanto Joaquim Barbosa, o ministro que teve a coragem de mandá-los para a cadeia, é, pelo mesmo grupo político, taxado de vilão.