quarta-feira, 28 de março de 2018

A POLÍTICA DE DROGAS

Ouço “Descriminalizar as drogas é arriscado”, “O Brasil não está preparado para isso”. Estou falando de tema complexo, sei, sem fórmula pronta para resolvê-lo, que tem defensores e opositores, cada qual com seus argumentos sólidos, como também palpiteiros. É claro que o ideal é que não houvesse drogas nem consumidores. Mas pensar isso, hoje, no Brasil e no Mundo, seria abstração. Logo, pensar essa hipótese, é alienar-se da vida real. Entre os jovens, quem não experimentar um “baseado” ao menos, é ridicularizado pelo grupo. No entanto, a política da repressão - como sói acontecer em tudo quanto proibido - se encarregou de difundir o consumo e criar um poderoso mercado negro. Logo, não se pode fechar os olhos para essa realidade. O tráfico venceu a queda de braço. O tema impõe reflexão desapaixonada.
Vige no Brasil a Lei 11.343/06. No Congresso, tramitam vários projetos tendentes a modernizar esse Diploma legal, um deles do deputado, hoje ministro, Osmar Terra, médico, estudioso como poucos dos malefícios que as drogas causam aos seus consumidores. No entanto, se acolhido, mesmo tendo pontos elogiáveis no tratamento de dependentes químicos, não muda o norte ideológico-filosófico da Lei Antidrogas, que se assenta, no caso brasileiro, na repressão, e da qual se colhe um rotundo fracasso. Mas, então, o que fazer? Bem, ao certo ninguém sabe. O Mundo está em busca desse caminho. Uma coisa, fruto da experiência, já se sabe: o caminho trilhado pelo Brasil e por muitos outros Países até aqui se mostrou ineficaz.
A primeira pessoa que ouvi contrariar os rumos da política brasileira de drogas em vigor, foi Fernando Henrique Cardoso. Ao defender a descriminalização das drogas, achei que, tal qual fizera quando presidente da República, logo pedisse que esquecêssemos o que tinha dito. Mas não. Sua tese sobre a política de drogas é mais consistente do que suas convicções sociológicas. Depois foi a vez de Marli Rozek. A ex-secretária municipal de educação, em tese de mestrado que tive a honra de ler em 1º lugar ao revisá-la, concluiu, também, que a política brasileira antidrogas fracassou.
A propósito, o Uruguai comercializa a maconha. É uma experiência nova, incipiente. No entanto, os resultados são satisfatórios, não quanto ao consumo, que se mantém, mas na redução dos lucros dos narcotraficantes. Lá, 30% dos usuários da droga, a partir da liberação do consumo da maconha, deixaram de recorrer ao mercado ilícito. Quer dizer, o mercado negro uruguaio perdeu em torno de 1/3 do seu faturamento.
Grosso modo, no mundo das drogas existem dois grupos: a) traficantes que, com a comercialização ilícita do produto, acumulam riquezas e, para se manterem, praticam desde a “benemerência” até o extermínio de concorrentes, consumidores inadimplentes e parceiros infiéis; b) consumidores, as vítimas que alimentam o crime.
O Brasil está dominado pelo crime. A droga está na base da criminalidade. Urgem, pois, medidas que revertam o quadro. Sei que apenas a legalização da maconha não diminuirá o consumo, mas estou convencido que afetará o poderio do crime organizado. E quando não se pode matar o inimigo, uma das estratégias é, como fizeram potências europeias na conquista de território africano, “dividir para reinar”.

XUXA E JULIETA

Xuxa, batizada e registrada Maria da Graça, muito cedo deixou Santa Rosa para, ainda adolescente, se tornar personagem global. A inserção de seu pseudônimo no seu registro de nascimento, oficializou-a Maria da Graça Xuxa Meneghel. Descendente de tradicional família santa-rosense, aqui nasceu e viveu por quase 10 anos. Cidadã idolatrada por milhões de pessoas de todas as idades, rejeitada por muitos, tem mais admiradores fora do que na sua terra natal. Registro um fato. No início dos anos 2.000, patrocinava eu uma ação judicial em São Paulo. Em determinado momento precisei acessar o processo (nada era eletrônico) que tramitava em o Fórum próximo à Praça da Sé. Preocupado com a cidade grande e, para mim, estranha, socorri-me de um colega, de Passo Fundo, estabelecido na capital paulista.
Era o escritório do Dr. Motta, que me recebeu e destacou uma advogada para me acompanhar. No Cartório, enquanto aguardávamos cópias do feito, entre uma conversa e outra, a colega me perguntou de onde eu era. Disse ser de Santa Rosa, o que nada significou. Acrescentei ser da terra do Taffarel. Também nada mudou. Ocorreu-me dizer que era da terra da Xuxa. Bem, a partir daí, a prosa mudou de rumo. E, ao aduzir que, como advogado, fizera a inserção do apelido em seu registro civil (autos originais no Memorial Xuxa), a colega me transformou em íntimo da Xuxa, que nunca fui. Apenas prestara um serviço profissional a ela por indicação de familiar seu.
Ao retornarmos ao escritório Motta, minha gentil cicerone reuniu umas 30 pessoas (advogados, estagiários etc) às quais me apresentou como conterrâneo da Xuxa. Foi impressionante! Senti, no bate-papo que se sucedeu, a importância da santa-rosense ilustre e quão pouco explorada (cultivada) é, aqui, sua marca. Daí por que, ao tomar conhecimento que a Prefeitura vai reformar o Memorial Xuxa, aplaudo. O prefeito Alcides Vicini que, em 2.002, adquiriu a casa em que a Rainha dos Baixinhos viveu, agora propõe dar ao Memorial nova dimensão. O projeto, com a assinatura do artista Betto Almeida, projeta transformar a Av. Rio Grande do Sul na “Rua Encantada”. Por que, não! Gramado, com muito menos, transformou-se em atração turística do mundo.
Santa Rosa tem Xuxa - apresentadora, atriz, cantora, filantropa e modelo. Verona - pasmem! - tem Julieta, que não existiu. Xuxa, filha de Luiz e Alda, é de carne e osso; Julieta, filha de Shakespeare, é mera ficção. Pois bem. Verona (Itália) tem a Casa de Julieta. No pátio, foi erguida uma estátua de bronze da personagem. A trágica história de amor e ódio entre ela e Romeu teria se passado em Verona. Ficção e verdade se confundem. Turistas do mundo lá fazem compras personalizadas e se fotografam ao lado da estátua com a mão no seio direito da musa, o que geraria sorte no amor.
A motivação é o motor do organismo para a ação. Gramado não teve Julieta nem Xuxa. Teve, na natureza, obra do Arquiteto do Universo, a motivação que a tornou capital do Cinema, do Chocolate e do Natal Luz. Santa Rosa não tem Shakespeare mas tem Xuxa, que o dramaturgo não teve. Verona é grata a Shakespeare. Santa Rosa será eternamente agradecida a quem valorizar e perpetuar sua filha ilustre.

segunda-feira, 5 de março de 2018

CADA UM POR SI, DEUS ...

“Cada um por si, Deus por todos”, é um adágio popular antigo, sem a certeza de onde e quando surgiu, nem quem o tenha cunhado. Sei que é vetusto, pois meu avô já o usava, que dizia tê-lo aprendido com seus antepassados. Nossa! No entanto, por refletir o momento brasileiro, continua mais atual do que nunca. Está, pois, incrustado em toda parte: nos três poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário), nas entidades de classe etc. Aliás, a anomalia vive seu apoteótico momento, traduzida em: eu estando bem (egoísmo), os outros que se danem (indiferença com o semelhante).
Esse viés torto se disseminou e, pior, encontra guarida em tudo. No entanto, limito-me a um caso que se enraizou na vida das pessoas e consome fortunas: as tão disputadas, as nefastas mordomias. Seus usufrutuários, com aparência modesta às vezes, estão de pleno acordo com mudanças desse estado de coisas, desde que preservados seus privilégios. Ou seja, na casa dos outros, nem pensar; na casa própria, sim. Para o 1º grupo, mordomia é conquista; para o 2º grupo, é privilégio.
A materializar a “copa franca”, cito o Supremo Tribunal Federal, assim como poderia invocar outras instituições. A Corte Suprema tem uma frota de 87 veículos: 11 para os ministros (1 para cada ministro); 25 para os gabinetes; 51 para atividades diversas. Que beleza! Só com os salários, seus motoristas, em 2017, custaram R$ 3,7 milhões. Com combustível, pneus, consertos, as cifras, não reveladas, com certeza dobram.
A farra também não é só no STF, mas em todos os tribunais superiores (STF, TSE, STJ e STM). De comum entre eles, ainda, a nomeação dos seus membros ao alvedrio do Chefe da Nação. Pois bem, só com passagens e diárias, em 2017, consumiram quase R$ 6 milhões, assim: STF, R$ 1.588.000,00; TSE, R$ 1.437.000,00; STJ, R$ 1.366.000,00; STM, R$ 1.267.000,00. Isso é um escárnio em País que a saúde agoniza. É por isso que pagamos imposto de 1º mundo e temos serviço de 3º mundo.
Mas não só lá. A Câmara e o Senado, em 2017, tinham em torno de 16 mil servidores para 513 deputados e 81 senadores. Segundo a ONG Contas Abertas, no ano, o Congresso custou R$ 1.160.000,00 por hora (x 365 = R$ ...). A justificativa para tanta gastança é a democracia. Logo, tudo seria para o bem do povo. De fato, democracia é um regime político caro. Mas, que “mal pregunte”, precisa ser tão caro? Não. Custa tanto porque uns poucos usufruem vantagens ao arrepio da ética e da lei.
Mas, quando o tema é mordomia, para que não se mire apenas Brasília como Ilha da Fantasia, a bem da verdade é preciso dizer que essa praga está, de igual forma, nos municípios e nos estados (executivos, legislativos e judiciário). A esperança é que um dia a “vaca barrosa” seque. Mas isso não vai acontecer como castigo dos deuses, não; só acontecerá se todos que execram privilégios exercerem a cidadania, começando por arredar a máxima da política brasileira de que companheiro não tem defeito.
Parafraseando o gaúcho (de Rio Grande) Barão de Itararé, batizado e registrado Apparício Fernando de Brinkerhoff Torelly, jornalista, mestre em ironizar ricos, classes média e pobre, digo: “Restaura-se a legalidade ou nos locupletemos todos.” Sim, porque mordomias e outras coisas mais ..., sempre para os mesmos, não tem graça.

CASO KISS FORA DO JÚRI

É a primeira vez que me manifesto sobre o lamentável caso Kiss, o que faço, sem entrar no mérito da tragédia, com o intuito de tecer algumas observações à guinada que o 1º Grupo Criminal do TJ-RS deu no julgamento futuro de Elissandro, Mauro, Luciano e Marcelo. O episódio é tão importante que não poderia passar despercebido. Só para lembrar, a competência para o caso estava reservada ao Tribunal do Júri por força da sentença de pronúncia do Dr. Ulysses Louzada, juiz de Direito de Santa Maria, para quem voltará o processo se não houver nova mudança. No julgamento do último dia 1º, duas teses foram confrontadas pelos desembargadores com o resultado de 4 a 4, o que atesta que há argumento tanto para um lado quanto para o outro.
Concluída a instrução do processo, em Santa Maria, o juiz de Direito havia se deparado com as duas teses de consequências antagônicas, separadas, por paradoxal que pareça, por linhas tão tênues que, às vezes, se cruzam. Grosso modo, uma, a tese da Promotoria de Justiça, acatada pelo juiz do caso - a do dolo eventual, que se dá quando seu agente vai além da mera culpa, ou seja, assume o risco de seu ato infracional culposo; a outra, a tese da defesa - a da culpa, que se dá por imperícia, imprudência ou negligência do infrator.
No julgamento recente de recurso da defesa, pelo TJ-RS, prevaleceu a tese dos réus, a qual, se confirmada, ao contrário também do que se especulou, não levará os réus do caso Kiss à absolvição, mas, sim, devolverá o feito ao juiz de Direito para julgamento ao invés de submeter a 7 juízes leigos (Tribunal do Júri) controvérsia tão subjetiva quanto ao tipo penal a ponto de dividir os 8 desembargadores.
Não morro de amores pelo Tribunal do Júri, e não é porque tivesse me dado mal nos casos em que nele atuei. É porque, melhor do que 7 leigos, submetidos a pressões, vejo no Juiz de Direito, técnico e imune a influências, a pessoa talhada para julgar. O Júri, vamos combinar, julga pela simpatia ou antipatia do réu, do promotor de justiça, do advogado de defesa etc. Ah, sim, é verdade, também julga com base nas provas.
No julgamento referido, embora não tenham dito, os 4 desembargadores que enquadraram os réus da Kiss no tipo penal restrito à culpa, levaram em conta que eles entrariam no Tribunal do Júri com 7 votos em seu desfavor. Ou algum jurado daria voto contrário às famílias das vítimas da Boate? É o típico processo em que os 7 jurados querem distância do sorteio. Integrar o conselho de sentença, nem falar.
Da decisão que afastou o dolo eventual, o MP anunciou que vai recorrer. Em tese, reverter o caso é possível. Eu, embora há anos afastado do processo-crime, arrisco prever que o recurso não terá êxito. É que, no STJ, não é admitido reexame da prova, apenas eventuais formalidades atropeladas. E o caso, para ensejar sucesso ao recurso, depende essencialmente de novo exame da prova.
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É tempo de pedidos. Lula, Temer, Aécio, Cabral tem um só: seus processos passarem para Gilmar Mendes. Na ausência deste, para Tofoli ou Lewandowski.
O recurso do Lula será julgado até março/2018. Lula reclama da rapidez do TRF-4. Que estranho! Eu sabia que inocente quer celeridade no julgamento, não o contrário.