terça-feira, 5 de junho de 2018

ELES SABEM

Faz alguns anos, L. F. Veríssimo dedicou uma das suas colunas (ZH) aos barbeiros, classificando-os de profissionais que sabem tudo da sociedade. Por trabalhar próximo a Antônio Boiczuk, concordo com o escritor. Pessoas que frequentam o salão do Toni, não raro, além da troca de informações naturais fazem ao cabeleireiro confissões que não fariam em outro local. Assemelham-se aos adeptos da Igreja Católica no confessionário, com a diferença de que, na casa do Papa Francisco, há um ritual a ser cumprido pelos fiéis: o padre ouve os pecadores arrependidos, guardando segredo absoluto sobre tudo que ouviu. Já com os cabeleireiros não há juramento de sigilo; há, com os homens da tesoura, confiança que regula a intensidade das confidências.
Faço essa introdução para chegar até aqueles que exerceram funções públicas no topo da pirâmide administrativa, agora motivado pelo vazamento da Agência Central de Inteligência, do EUA, sobre o regime brasileiro de exceção iniciado em 1964, mormente durante o governo Geisel: a tortura aos inimigos do regime. Ora, o mesmo ocorreu nos períodos anterior e posterior a 1974/1979, bem como durante a era Vargas, de 1930 a 1945, para, em final, se chegar aos governos eleitos mais recentemente, Lula e Dilma, estes em campo ideológico diferente do dos presidentes ditadores, concluindo que todos, de tudo, sabiam, embora a negativa seja a regra.
O vazamento de documentos da CIA insinua que Geisel, quando presidente do Brasil, e o seu chefe do Serviço de Informações, o general João Batista Figueiredo, sabiam do sumiço de adversários do regime. O fato vindo a público na semana passada pelo pesquisador da FGV, Matias Spektor, é de que Geisel teria apoiado a eliminação de pessoas que queriam substituir o governo militar pelo regime de Cuba.
Acho que nada disso é novidade. Antes de 1964, com Getúlio Vargas, também existiram coisas misteriosas. Entre 1930 e 1945 - quando, tal qual no regime militar, não tivemos eleições, a censura e a repressão foram intensas - o são-borjense no poder supremo da Nação sabia das práticas desumanas comandadas pelo seu Chefe de Polícia, Filinto Muller. A propósito, é da Era Vargas a criação do “anjinho”, alicate que os policiais usavam para esmagar testículos de adversários.
Nos períodos Lula e Dilma, a Polícia, o MP e a Justiça desvendaram os dois maiores esquemas de corrupção da história: o Mensalão do PT e Petrolão. Mas os dois presidentes nada sabiam. Verdade? Não. Primeiro disseram que nada sabiam. Lula, inclusive, se disse traído por assessores; depois, quando os escândalos chegaram às suas casas, passaram para a desqualificação da polícia, do MP e dos juízes.
Getúlio Vargas e Ernesto Geisel sabiam das torturas em seus governos, assim como Lula e Dilma sabiam da corrupção em seus governos. Os chefes sabem dos projetos e das irregularidades. Já Che Guevara, na ONU, referindo-se aos adversários do regime cubano - sem nenhum apreço, é claro, ao argentino sanguinário que se aliou a Fidel - foi sincero: “Fuzilamos, estamos fuzilando e seguiremos fuzilando”.
Os barbeiros e os presidentes sabem tudo à sua volta. A diferença está na sinceridade. Os 1ºs guardam os segredos na discrição; os 2ºs, na faixa presidencia

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